Até quando você vai ficando mudo?
José acorda às 4h30min da
manhã para ir ao trabalho. Ao sair, se despede da mulher e seus três filhos.
Tem uma jornada longa pela frente, dois ônibus e um metrô, e no fim do mês?
APENAS UM SALÁRIO MÍNIMO. Enfrenta três horas de trânsito em pé, no aperto e
sente falta de um transporte público de qualidade, mas, infelizmente, agora ele
só consegue pensar na mãe que está há meses na fila do SUS esperando
tratamento. Freada brusca, mais aperto ao descer e, enfim, José chega ao
trabalho, lá se depara com outros Josés revoltados com a notícia: a passagem
acaba de aumentar 20 centavos. E não são só 20 centavos, ainda tem a volta.
José não existe, mas todo dia acorda um José, e hoje eles resolveram ir para as
ruas.
Foto: Leia já. |
José hoje acordou, e viu que o país também é
dele, José é você, José sou eu, somos nós que lotamos as ruas do Brasil nos
últimos dias. Deixamos de "deixar estar" e fomos perguntar onde estão
os mais de 720 bilhões arrecadados em impostos só este ano. José foi cobrar,
porque o dinheiro que era para ser dele foi para os estádios de uma copa, um
jogo de futebol pelo qual ele não via mais graça em torcer, não daquele jeito. A seleção foi campeã, salve Brasil, salve a
seleção? Sim, salve a seleção. Mas isso não pode calar a voz de milhares de
Josés que ainda estão lutando por seus direitos, os números nos protestos
diminuíram, é fato, pelo fim do modismo ou pela comodidade que é sentar-se mais
uma vez em frente à TV e não olhar ao redor a realidade, outros tantos ficaram
pelo caminho. E esses Josés que continuam nas ruas estão apanhando sendo
duramente reprimidos enquanto o povo comemora e grita gol.
A copa das confederações
acabou, conseguindo ofuscar um pouco as manifestações que estão dominando o
Brasil, mas será que agora podemos voltar ao assunto principal? Quando
estudamos para provas na escola, não podemos deixar os assuntos acumularem, por
não conseguirmos dar conta depois. O mesmo está acontecendo com o Brasil: adiamos
por anos nossos problemas. E, entendam, essa bola de neve já vinha crescendo há muito tempo e nada era feito, afinal pra que serve o jeitinho brasileiro? Jeitinho
Brasileiro com que nossos governantes lidaram com os problemas. Quando falamos governantes, não dizemos Dilma, ela não tem culpa da confusão "estourar"
em seu governo, tanto que foi a PRIMEIRA líder mundial a ouvir as ruas. E, mais
uma vez, não estamos defendendo ou apoiando nenhum partido ou governo mas parem
de sair com cartazes culpando Dilma pelo gasto na copa, quem pediu a copa fomos
nós, mas infelizmente houve abuso no uso do dinheiro (como sempre). E quando
finalmente "acordamos" e conseguimos conquistar algumas medidas, o
movimento perde força. Sim o MPL (Movimento de Passe Livre) saiu da frente dos
protestos, mas só por isso devemos nos acomodar? Acomodar por conseguir
derrubar a PEC 37 e diminuir o preço da passagem em muitas cidades no Brasil?
Enquanto governadores continuam ganhando um absurdo e o nosso dinheiro continua
sendo desviado a todo momento? Enquanto Feliciano continua tentando dar força a
ideias intolerantes para um país laico?
A resposta é não. Não
devemos nos acomodar. Ninguém disse que iríamos acordar um belo dia com todos
os problemas resolvidos, né? As coisas não caem do céu. “Mas eu não posso ir às
ruas porque eu trabalho ou porque meus pais não deixam ou porque eu tenho medo
ou...” lembrem-se: o que deu força a esse movimento? O que fez com que tudo
tomasse a proporção que tomou? A internet. As redes sociais. Um
compartilhamento não é só mais um compartilhamento, um tweet não é só mais um
tweet, pessoas vão ler e alguém vai se sentir tocado e impulsionado a fazer o
mesmo, a lutar.
Ok, supondo que
conseguimos convencê-lo a continuar na luta vem a pergunta: lutar pelo quê? Os
motivos acima não bastam? Todos querem saúde, transporte e educação de
qualidade, o fim da corrupção e da miséria, mas esses motivos não generalizam
demais? O grande problema é o foco. Por onde começar em uma cidade como Recife
que levou milhares às ruas com ideologias e pedidos dos mais diversos? É aquela
velha história de que quem tudo quer acaba sem nada, por isso o foco é tão
importante. Por onde começar um novo Brasil? O grupo Anonymous Brasil propôs
cinco causas pelas quais devemos ir atrás e, dessas cinco, duas já foram
atendidas, aos poucos completaremos a lista e acrescentaremos mais
reivindicações.
Entretanto, fazendo uso
de um clichê que tem se repetido nesses tempos, nada muda se o povo não mudar.
Por isso argumentem, pensem, leiam, discordem, critiquem... Retomando o texto
de Tom Zé com que voltamos ao blog: NÃO SE TORNEM ‘ANDROIDES’, “pensar SEMPRE
será ousar”. Sejamos ousados para que não sejamos usados, mais uma vez.
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